Frase da Semana

“O sono é o doce consolador dos homens. Dá-lhes repouso e o esquecimento de seus pesares.” Torquato Tasso

#28 – Afinal, o que nos faz dormir?

 

Que o sono é extremamente importante para a nossa saúde mental já está claro, mas afinal, o que influencia nossa capacidade de adormecer?

Mas antes de falar especificamente sobre estes processos fisiológicos, vou responder uma dúvida frequente de vocês: “Será que existem pessoas mais noturnas ou diurnas”?

Cronotipo se refere a essas características individuais do nosso ciclo circadiano, ou seja, se temos preferência para funcionar melhor à noite ou de manhã.

Essas variações têm a ver com os ciclos naturais do nosso corpo, assim como mudanças de temperatura ao longo do dia e horário de produção natural de melatonina.

Algumas pessoas funcionam melhor indo dormir mais cedo e acordando mais cedo. Essas mesmas pessoas costumam preferir realizar atividades importantes do dia logo pela manhã, chamamos essa característica de “Fase de Sono Avançada”.

De forma diferente, outras pessoas funcionam melhor indo dormir mais tarde e acordando mais tarde, e então preferem realizar as principais atividades da sua rotina ao fim do dia ou a noite, o que chamamos de “Fase de Sono Atrasada”.

Naturalmente, há um continuum entre esses dois polos, com pessoas sem uma preferência bem definida.

Veja 5 informações que você precisa saber sobre cronotipo:

1. Mudanças ao longo da vida:
É muito comum que adolescentes tenham uma fase de sono atrasada (preferência noturna) e, ao longo da vida, haja um progressivo adiantamento da fase de sono. Em contraste, muito frequentemente idosos têm uma fase de sono avançada (preferência matutina).

2. Rotina 
Pessoas com preferências mais extremas (muito matutina ou muito noturna) às vezes têm dificuldade em adequar a própria rotina de trabalho e vida pessoal ao ciclo circadiano.

Em geral, é necessário que haja ajustes na rotina e escolhas pessoais (de profissão e emprego, por exemplo) precisam refletir essa característica pessoal. Em situações mais extremas, em que há prejuízo para o funcionamento cotidiano, pode-se fazer o diagnóstico de Transtorno do Sono Relacionado ao Ritmo Circadiano.

3. Exageros.
Sim, é verdade que adolescentes tenham uma preferência noturna e idosos uma preferência matinal. Entretanto, muito também ocorre por mudanças voluntárias e deliberadas, e não relacionadas a características dos ciclos naturais do organismo.

Isto é, muitos adolescentes e adultos acabam indo dormir muito tarde porque se envolvem em múltiplas atividades de lazer até tarde da noite, como séries e jogos.

Em contraste, muitos idosos têm dificuldade em se adaptar a necessidades de sono progressivamente menores típicas da idade e acabam indo dormir cada vez mais cedo.

4. Diagnóstico
Muitos diagnósticos diferenciais precisam ser considerados, como depressão, insônia, outros transtornos do sono, e transtorno bipolar. Inclusive, cronotipo atrasado (preferência noturna) tem relação com depressão, transtornos ansiosos e transtorno bipolar. Fique de olho!

5. E dá pra mudar?
É possível, em primeiro lugar, evitar os exageros e buscar um estilo de vida saudável. Planejar a própria rotina é importante, assim como fazer escolhas de vida mais coerentes com o próprio cronotipo.

Há também tratamento, seja com melatonina ou com um tipo específico de fototerapia (tive bons resultados com alguns pacientes com ambas as opções, inclusive).

Mas afinal o que determina que a gente adormeça?

Podemos responder essas perguntas ao analisar dois processos fisiológicos responsáveis pelo nosso ciclo de sono: o processo homeostático e o processo circadiano.

processo homeostático pode ser compreendido como uma “pressão” para o sono (“sleep drive”; necessidade de sono) que é gerada a cada momento que permanecemos acordados, principalmente se estamos ativos, e que é “esvaziada” ao longo da noite de sono ou se dormimos durante o dia.  

Diante de um dia pouco ativo, essa pressão é acumulada mais lentamente. Ao nos expormos ao Sol durante o dia, essa pressão é acumulada mais rapidamente. Eliminamos essa pressão quando tiramos cochilos durante o dia.

O que precisamos é chegar a noite com essa pressão muito bem acumulada, para que a gente adormeça e a elimine ao longo da noite. Intuitivamente, sabemos que se um dia acordamos muito mais tarde do que o habitual, vai ser muito difícil adormecer no horário de sempre.

O segundo processo, o processo (de ritmo) circadiano, por sua vez, se refere ao ritmo de aproximadamente 24 horas do nosso organismo. É devido a ele que dormimos a noite e permanecemos acordados durante o dia. O horário de pico da sonolência para a maioria das pessoas é aproximadamente entre as 3h00 da manhã e 5:00 AM.

Ele é o oposto do processo homeostático e é necessário para que a gente permaneça acordado durante o dia. 

Enquanto o processo homeostático indica a carga (intensidade) de sono, o processo circadiano determina quando dormir.

Uma rotina regular não somente quanto ao horário de dormir e de acordar, mas também quanto a refeições ajuda esse processo a não perder sincronicidade com o ciclo de claro e escuro a que estamos submetidos.

Além disso, há uma pequena queda na propensão ao estado de alerta à tarde, o que traz para muitas pessoas uma necessidade de um cochilo.

Ainda sobre este sistema de alerta, este é essencial e nos permite uma resposta adequada a ameaças perigosas. Em outras palavras, se estivermos ameaçados de madrugada, é importante que possamos permanecer alertas mesmo com uma pressão de sono elevada e que estejamos em uma hora do dia que nosso sistema em geral entender que deveríamos estar dormindo. 

E de onde vem esse sistema de alerta? Vem de estresse. E é por isso que estresse mal gerenciado é uma causa extremamente frequente tanto de insônia aguda quanto de insônia crônica e é por isso que aprender a gerenciar estresse é fundamental para tratar insônia adequadamente!

Os processos que descrevi na newsletter de hoje funcionam juntos para nos permitir um sono de qualidade.

Aumentamos nosso drive de sono homeostático ao longo do dia, o que nos ajuda a adormecer à noite. No meio da noite, nossos ritmos circadianos nos mantêm dormindo. Em seguida, acordamos com um baixo impulso de sono homeostático e um ritmo circadiano de alerta crescente.

Na próxima semana vou falar sobre Higiene do Sono e um conjunto de meios utilizados para manter uma rotina adequada e saudável de sono, te espero lá.

 

Muito Além da Saúde Mental

 

💻  Esta semana publiquei um vídeo sobre Depressão e o Modelo de Cinco Fatores. Se você é profissional da área da saúde, clique aqui para assistir.

🎙 No episódio 78 do Papo de Psiquiatra falamos sobre “O impacto dos antidepressivos na libido e na vida sexual”. Clique e confira.

 

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